Se o Fundo Monetário Internacional entrar no país, os especialistas dizem que o desemprego vai aumentar, tal como os impostos. Diminuições só mesmo ao nível dos apoios sociais e dos salários dos funcionários públicos. Mas, por enquanto, este é um cenário hipotético. Diria que, se o FMI entrar em Portugal, é muito provável que aumente o desemprego, que aumente a carga de impostos e é muito provável que o Estado encolha significativamente a sua área de influência, através de um corte significativo da despesa. Isso pode significar também um toque nas pensões de reforma ou até ainda uma nova mexida nos salários dos funcionários públicos”, diz o economista João Duque. Opinião semelhante tem João César das Neves. Segundo o economista, "o cidadão comum vai ter de pagar mais impostos, vai receber menos subsídios do Estado, menos salários para quem trabalha para o Estado". "É, aliás, o tipo de coisas que vamos ter com FMI ou sem FMI”, completa. Esta é a moeda a pagar para equilibrar as contas públicas e garantir o financiamento e sobrevivência do próprio Estado. Ao acordar um plano de recuperação económica com o Fundo Monetário Internacional, o Governo vai ser mesmo obrigado a cumprir as medidas e "a pôr a casa em ordem", afirma João César das Neves. Uma pequena equipa de pessoas, ao entrar no país, vai obrigar o Governo a implementar, sem recuos, as medidas que são anunciadas", corrobora João Duque. Mesmo que isso signifique que a liberdade do Estado para executar a política económica fique “muito constrangida”, considera, por seu lado, Cristina Casalinho, economista-chefe do BPI. O que mudaria na nossa vida se o FMI viesse a Portugal? Não há uma resposta absolutamente concreta. Pela primeira vez, no passado fim-de-semana, o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, admitiu que, se os juros cobrados a Portugal para emitir dívida se aproximarem dos 7%, o recurso ao FMI "começa a colocar-se". Opinião diferente parece ter, no entanto, Carlos Pina. O secretário de Estado do Tesouro afirmou hoje que recorrer à ajuda financeira internacional nem sequer está nos cenários de trabalho do Governo.
FMI, não há força que retorça o FMI
A letra da música de José Mário Branco, de 1979, é paradigmática da situação económica e social que Portugal vivia aquando da intervenção do Fundo Monetário Internacional. "O FMI veio cá duas vezes. Em 1977 e em 1983. Nas duas vezes, estávamos sem conseguir obter créditos, estávamos com muita dificuldade em fazer todos os pagamentos que o país precisava de fazer ao exterior e o FMI veio cá com o objectivo de corrigir este desequilíbrio", recorda Silva Lopes, antigo ministro das Finanças. Depois de dois choques petrolíferos, da contracção da economia internacional e da subida da dívida externa, o Fundo Monetário Internacional regressou a Portugal. Para equilibrar as contas, recorda Silva Lopes, "impôs-nos uma desvalorização da moeda, porque nós tínhamos na altura uma moeda própria, que era o escudo, coisa que agora não pode impor", prossegue Silva Lopes. "Além disso, impôs-nos subidas das taxas de juro e limites à expansão do crédito. Também neste momento não se pode fazer isso, porque quem manda é o Banco Central Europeu”, completa Foram tempos difíceis. “Os salários reais caíram muito, mesmo muito”, houve “salários em atraso, aumento do desemprego” em 1983 e até fome “nalgumas zonas do país”, sublinha Silva Lopes. O ex-ministro e antigo governador do Banco de Portugal sublinha que “realmente foi difícil, mas foi curto”. Esquiva-se a fazer comentários sobre a situação actual do país, mas lá vai dizendo que “é muito difícil comparar". "Naquela altura, houve uma situação rápida e uma solução que não foi tão dolorosa como provavelmente será a de agora. A de agora não é tão rápida e é mais dolorosa”. Mas Silva Lopes não tem dúvidas: o FMI salvou a economia portuguesa. "Se não fosse o FMI, nós tínhamos tido uma desgraça na economia e assim a economia, ao fim de dois anos, estava a progredir bastante bem em qualquer dos casos."
Agora o contexto mudou, pelo que a entrada do FMI, pela terceira vez, em Portugal “não quer dizer que vá conseguir” endireitar a economia do país, conclui Silva Lopes.
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